terça-feira, 8 de novembro de 2011

O 1º de abril

No domingo passado Rosamundo chegou em casa para o almoço, depois de um substancial mergulho no Atlântico sul (Ala de Ipanema), e não vendo movimento nenhum na casa, berrou: — Jurema!!!

O grito ecoou pela casa toda e Jurema não apareceu, o que, aliás, é justo: Jurema foi a primeira mulher de Rosamundo, da qual se separou vai pra seis anos. Encabulado da própria distração, gritou pela mulher certa:

— Clotilde!

E neca. Clotilde não estava.

O Rosa achou estranho, mas foi tomar seu banho. Só quando passou pelo corredor, enrolado na toalha, é que deu com o bilhete preso no espelho. Dizia assim: "Rosamundo, já não te suporto mais. Isto já não é de hoje, mas só hoje resolvo ir embora. Não tente reconciliação porque já gosto de um outro alguém".

A mulher de Rosamundo sempre foi de pouco refinamento. Adora filme de Mazzaropi, disco de Anísio Silva e a expressão "um outro alguém", que leu certa vez num poema de J. G. de Araújo Jorge, outra de suas paixões.

Rosamundo ficou com o bilhete na mão, sem entender direito. E já ia cair sobre uma poltrona com o impacto da notícia, quando se lembrou que era o 1º de abril. Sorriu compreensivo e deixou pra lá. Sua mulher era um bocado brincalhona.

O diabo é que passou o domingo, ele esperou durante toda a segunda-feira, toda a terça-feira e hoje — quarta-feira — começou a achar que era 1º de abril demais. Vestiu-se para ir à casa da mãe de Clotilde, dar queixa da mulher. Ao abrir a porta viu um chapéu no cabide. Botou na cabeça e o chapéu desceu até o nariz:

— Bem que me disseram que o Cabeção dava em cima dela — pensou Rosamundo.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora