quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O diabo brinca com um mordomo

Um cavalheiro na Irlanda, que vivia perto da casa do conde de Orrery, enviou seu mordomo uma tarde para uma aldeia próxima, a comprar cartas de baralho.

Quando este passou por um campo, divisou um grupo no meio, sentado em torno de uma mesa, onde havia várias iguarias. Quando se aproximou do grupo, todos os seus componentes se levantaram e o saudaram, expressando o desejo de que se sentasse e com eles partilhasse da comida. 

Um deles, no entanto, sussurrou as seguintes palavras no seu ouvido: - Nada faça do que eles o convidam a fazer. - Então, como ele recusou a aceitar-lhes o convite, a mesa e todas as iguarias que a eles guarneciam desapareceram, mas o grupo entrou a dançar ao som de vários instrumentos.

Foi outra vez o mordomo solicitado a participar dos divertimentos, mas nada o convencia a neles ingressar. Por esse motivo, os membros do grupo abandonaram o seu divertimento e começaram a trabalhar, solicitando ainda ao mordomo que a eles se juntasse. Este, no entanto, recusou. Assim, diante de sua terceira recusa, eles todos desapareceram e deixaram o mordomo sozinho, o qual, muito consternado, regressou à casa sem os baralhos, desmaiou quando passou pela porta, mas recuperou os sentidos e contou a seu patrão tudo o que se passara.

Na noite seguinte, um dos fantasmas veio para o pé de sua cama e disse-lhe que, se ousasse dela sair no dia seguinte, seria carregado. Aceito esse conselho, manteve-se quieto até a tardinha, mas, tendo necessidade de urinar, aventurou-se a colocar um pé para fora da porta, coisa que ele tinha acabado de fazer quando uma corda lhe foi passada pela cintura, à vista de várias testemunhas, e o pobre homem foi arrastado para fora da casa com uma rapidez inexplicável, seguido por muitas pessoas.

Mas não foram bastante ágeis para alcançá-lo, até que um cavaleiro, muito bem montado, encontrando-o na estrada e vendo muitos seguidores atrás de um homem puxado por uma corda, sem que ninguém o forçasse, pegou da corda e o parou em sua carreira, mas, em pagamento, recebeu uma tal lambada nas costas, com uma das extremidades da corda, que quase caiu do cavalo. No entanto, sendo um bom cristão, ele se mostrou excessivamente forte para o diabo, e resgatou o mordomo dentre as mãos dos espíritos, trazendo-o de volta para seus amigos.

O lord Orrery, ouvindo falar de tais lances, para conhecer-lhes melhor a verdade, mandou chamar o mordomo, com permissão de seu empregador, e pediu-lhe que passasse algumas noites em sua casa, ao que o empregado obedeceu. O empregado, depois de ali pernoitar pela primeira vez, disse ao conde que o espectro voltara a visitá-lo e lhe dissera que naquele mesmo dia ele desapareceria nos braços dos espíritos, por mais que se tomassem medidas para impedir que isso acontecesse. Diante do que foi levado a um grande aposento, onde se encontravam em grande número pessoas santas para defendê-lo dos assaltos de Satã, entre as quais estava o famoso restaurador de pessoas enfeitiçadas, o senhor Geatrix, que morava nos arredores, e sabia, como se pode supor, como tratar o diabo tão bem quanto qualquer outra pessoa. Além disso, havia dignitários eminentes na casa, entre os quais dois bispos, todos esperando o acontecimento maravilhoso de tal inexplicável prodígio.

Até que decorresse parte da tarde, o tempo passou-se em paz e tranqüilidade, mas, por fim, percebeu-se que o paciente encantado elevava-se do solo sem qualquer ajuda visível, o que fez com que o senhor Geatrix e outro homem, este muito forte, o agarrassem pelos ombros e procurassem trazê-lo de volta ao solo, mas sem resultado. Pois o diabo mostrou-se excessivamente poderoso e, depois de uma luta renhida entre as partes opostas, obrigou os seus inimigos a largar o homem e, retirando-lhes o mordomo, transportou-o por sobre a cabeça dos presentes e o atirou no ar, de um lado para o outro, como se fosse um cachorro num lençol, enquanto várias pessoas corriam por debaixo do pobre homem para evitar que caísse ao chão. Por quais meios, quando terminou a brincadeira dos espíritos, não se pôde achar como naquela baderna, houvesse o amedrontado mordomo recebido o menor dano, saído ileso, aparecendo no mesmo lugar, na mesma condição, para provar que o demônio é um mentiroso.

Os duendes tendo, nessa ocasião, abandonado o seu passatempo e deixado o objeto de seu escárnio repousar um pouco, para que se pudesse revigorar antes do novo ataque, o lorde ordenou que, na mesma noite, dois de seus empregados com ele dormissem, com medo de que o diabo ou outra entidade viesse e o agarrasse, cochilando. Não obstante isso, o mordomo disse ao lorde na manhã seguinte que o espírito voltara a visitá-lo, com a aparência de um falso médico, e trazia na mão direita um prato de madeira cheio de um licor verde, como caldo de carne, à vista do que tentou acordar os seus companheiros de leito.

Mas o espectro disse-lhe que suas tentativas eram baldadas, pois seus companheiros, encantados, estavam mergulhados num profundo sono, e avisou-o para não se atemorizar, porque ele era o mesmo espírito que o precavera no campo, para que não se juntasse ao grupo que ali se reunia, quando partira para comprar cartas de jogar; acrescentou o espírito que se o mordomo não se tivesse recusado a obedecer ao que lhe pedia o grupo teria passado a sofrer a vida inteira. Também o espírito se mostrou espantado de que o mordomo houvesse escapado no dia anterior, porque sabia que contra ele se formara uma poderosa combinação. Disse que no futuro não haveria mais tentativas da mesma natureza. Afirmou o espectro que sabia que o mordomo era sujeito a duas espécies de acessos e que, como amigo, trouxera um remédio que o curaria de ambos, aconselhando-o a que o tomasse.

Mas o pobre paciente, que fora miseravelmente tratado por tal espécie de charlatães vestidos de médicos, e temendo que o demônio estivesse no fundo do prato, não queria deixar-se convencer a engolir a dose, o que enfureceu o espírito. Este disse-lhe, no entanto, que sentia afeição por ele, mordomo, e que, se este amassasse as raízes de uma bananeira, sem as folhas, e bebesse o sumo, ficaria certamente curado de uma espécie de seus acessos. Mas, como punição por causa da teimosia que o mordomo havia demonstrado, sofreria da outra espécie de acessos até morrer.

Então, o doutor espiritual perguntou ao paciente se o conhecia. O mordomo disse que não.

- Eu sou - disse ele - o fantasma errante, a alma penada de seu velho conhecido John Hobby, que faleceu e foi enterrado faz sete anos. E desde então, por causa do mal que fiz em vida, tenho andado em companhia desses maus espíritos que você viu no campo, e sou levado de um lado para o outro nessa condição em que não encontro repouso, estando fadado a continuar no mesmo estado miserável até o dia do juízo final. - Acrescentou o espírito fantasiado de falso médico: - Se você tivesse servido o seu Criador nos dias da juventude, e rezado na manhã em que saiu para comprar cartas de baralho, não teria sido tratado pelos espíritos que o atormentaram com tanto rigor e severidade.

Depois que o mordomo relatou tais passagens maravilhosas ao lorde e família, consultaram-se os dois bispos, presentes entre outras pessoas de qualidade, para saber se devia o mordomo seguir o conselho do espírito e tomar o sumo da bananeira, e se fizera bem ou mal ao recusar tomar o líquido que o espectro lhe oferecera. A questão ao princípio pareceu objeto de discussão, mas, depois de algum tempo, chegaram os bispos à conclusão de que o mordomo agira como um bom cristão, em todo o assunto, pois era um grande pecado seguir o conselho do diabo em qualquer coisa, e que nenhum homem devia praticar o mal com a esperança de conseguir o bem.

Em resumo, o pobre mordomo, depois de seus sofrimentos, não obteve qualquer recompensa pelo que passara, tendo-lhe sido negado, pelos bispos, o benefício, ou a aparência de benefício, que o espírito pretendia conferir-lhe.



Daniel Defoe (1660-1731), o célebre autor de As aventuras de Robinson Crusoé foi um dos mais prolíficos escritores que se conhece, com mais de 500 títulos publicados. Entre os inúmeros gêneros que abordou (religião, política, sociologia, história, ficção, poesia) no seu jornal The Review (que ele escrevia praticamente sozinho). Defoe acreditava profundamente na reencarnação e escreveu  Contos de Fantasmas baseado em entrevistas ou relatos conhecidos. Segundo ele, os episódios aqui relacionados – com exceção dos que estão agrupados sob o título de "Falsos fantasmas" – são todos verdadeiros e, em alguns deles, ele estaria disposta a ir em juízo, levando testemunhas e provas concretas. "A aparição da senhora Veal" é um dos exemplos.

O espectro e o salteador

Uma história nos conta que Hind, o famoso assaltante, o mais famoso desde Robin Hood, encontrou um espectro na estrada num sítio chamado Stangate-hole, no condado de Huntingdon, lugar onde usualmente cometia seus roubos, e famoso por muito assalto de estrada, desde então.

O espectro apareceu na forma de um simples vendedor rural de gado. E como o diabo conhecia muito bem os lugares em que Hind se escondia e que freqüentava, chegou a uma hospedaria, pôs o cavalo na cocheira e fez com que o hospedeiro carregasse a mala que trazia, que era muito pesada, até o quarto que alugara.

Quando se viu no quarto, abriu a mala, retirou o dinheiro, que parecia estar contido em vários pequenos embrulhos, e o colocou em não mais do que dois sacos, distribuídos de maneira a pesar igualmente dos dois lados do cavalo e a chamar tanta atenção quanto possível.

E raro que as hospedarias que abrigam ladrões não sejam freqüentadas por espias, para que proporcionem aos primeiros as necessárias informações. Hind soube do dinheiro, olhou o homem, olhou o cavalo, para que os pudesse reconhecer. Apurou a direção para onde se dirigia o comerciante. Esperou-o e encontrou-o em Stangate-hole, bem no fundo da garganta entre as duas colinas, e o fez parar, dizendo-lhe que devia entregar o dinheiro.

Quando Hind mencionou o dinheiro, o vendedor simulou surpresa, fingiu cair em pânico, tremeu, demonstrou bem o medo, e num tom digno de compaixão disse:


-Não passo, como o senhor vê, de um homem pobre! Na verdade, senhor, não disponho de dinheiro. (Assim o diabo mostrou que podia dizer a verdade, quando isso lhe servia.)

-Seu velho vagabundo! - disse Hind. - Você não tem dinheiro? Vamos, abra os seus alforjes e dê-me os dois sacos, um de um lado da sela e outro, de outro. Como é que você pode não dispor de dinheiro e, contudo, seus sacos são muito pesados para ficarem, os dois, de um lado só? Vamos, entregue o que tem, ou eu o farei em pedaços neste mesmo momento.

Ao dizer isso, é claro que Hind se excedeu, pois pronunciou ameaças que não podia cumprir.

O pobre diabo lamentou-se e chorou, e repetiu que o salteador deveria estar enganado; devia tomá-lo por outra pessoa, porque ele, de fato, não tinha dinheiro.

-Vamos, vamos - disse Hind venha comigo.

E tomou o cavalo do vendedor pelas rédeas e o conduziu para dentro da mata, muito densa de ambos os lados da estrada, porque o negócio tomaria tempo e seria perigoso concluir na estrada aberta.

Quando se achava no interior da mata, disse:

-Vamos, senhor Vendedor de Gado, desmonte e dê-me os sacos neste exato minuto.

Em poucas palavras, fez o pobre homem desmontar, cortou as rédeas e as cilhas do cavalo, abriu os alforjes, onde deu com os dois sacos.

-Muito bem - disse Hind -, aqui estão eles, e tão pesados quanto antes.

Atirou-os ao chão e abriu-os com a faca: num ele encontrou uma corda para enforcar, ou baraço, e noutro deparou com uma peça de estanho sólido na forma exata de uma forca. E o camponês que se achava atrás dele disse:

- Eis o seu destino, Hind. Tome cuidado! Se Hind ficou surpreso com o que achou nos sacos - pois não havia um só centavo de dinheiro no saco onde deu com a corda -, mais surpreso ainda ficou ao ouvir o vendedor chamá-lo pelo nome, e virou-se para matá-lo, pois julgou ter sido reconhecido. Mas o sangue lhe gelou nas veias quando, virando-se (como eu disse) para matar o camarada, não deparou com mais do que o pobre cavalo.

Caiu ao chão e ali permaneceu por um tempo considerável. Não lhe foi possível dizer quanto tempo, porque estava sozinho, mas deve ter sido questão de muitos minutos. Voltando a si, por fim, partiu aterrorizado ao mais alto ponto e envergonhado, pensando no que tudo aquilo significava.

Indiquei que não havia dinheiro num dos sacos, mas havia uma moeda no outro, moeda essa que a história diz que era escocesa: uma moeda na Escócia intitulada de um "quatorze", o que corresponde em inglês a treze pence e meio penny para pagar o carrasco. É possível supor que daí tenha derivado o dito popular, até hoje em uso, de que treze pence e meio penny é o soldo do carrasco.


Daniel Defoe (1660-1731), o célebre autor de As aventuras de Robinson Crusoé foi um dos mais prolíficos escritores que se conhece, com mais de 500 títulos publicados. Entre os inúmeros gêneros que abordou (religião, política, sociologia, história, ficção, poesia) no seu jornal The Review (que ele escrevia praticamente sozinho). Defoe acreditava profundamente na reencarnação e escreveu  Contos de Fantasmas baseado em entrevistas ou relatos conhecidos. Segundo ele, os episódios aqui relacionados – com exceção dos que estão agrupados sob o título de "Falsos fantasmas" – são todos verdadeiros e, em alguns deles, ele estaria disposta a ir em juízo, levando testemunhas e provas concretas. "A aparição da senhora Veal" é um dos exemplos.

Mausoléu de Halicarnasso

O mausoléu foi uma homenagem que a rainha Artemísia II, mandou construir, em 353 a.C., para o túmulo de seu irmão e esposo, o rei Mausolo. O rei Mausolo, era sátrapa da província de Cária, governou entre 377 e 353 a.C., e vivia em Halicarnasso na Turquia.

A palavra mausoléu surgiu por conta do rei Mausolo, que teve um reinado sem grandes percalços. Casou-se com a irmã, Artemísia, que o amava muito. Quando morreu, a tristeza dela foi tão grande que, segundo uma lenda, ordenou que as cinzas dele fossem misturadas à sua água e comida, para lamentar sua perda.

Para celebrar seu irmão e marido, Artemísia encomendou um grande mausoléu que abrigasse seus restos mortais. Selecionou o arquiteto Pítis para o projeto e contratou quatro escultores para embelezar a edificação (isso queria dizer um escultor para cada face do templo - Pítis esculpiria a estátua que decoraria o ápice do mausoléu). Os escultores selecionados foram Escopas, Briáxis, Leocarés e Timóteo.

Uma colina com vista para a cidade e a baía foi selecionada como local do mausoléu. Os trabalhos foram iniciados em 353 a.C. O mausoléu tinha 45 metros de altura, com uma base de 32 metros; incluía uma pirâmide de 24 degraus e sete metros de altura; e uma estátua encimando o conjunto, com altura de seis metros. O historiador Plínio, da era clássica, escreveu que o perímetro do mausoléu tinha 134 metros.

Escavações mais modernas levaram uma equipe dinamarquesa que trabalhou no local entre 1966 e 1977 a revelar que a construção provavelmente tinha 30 por 36 metros, com 36 colunas de sustentação.

A rainha jamais viu pronto o monumento a seu marido. Morreu apenas dois anos depois de Mausolo e foi sepultada com ele. No entanto, os trabalhos no mausoléu continuaram porque os artistas desejavam concluir seus projetos. Entre eles estavam a escultura de Mausolo e Artemísia em um carro puxado por quatro cavalos, obra de Pítis; frisos descrevendo a guerra entre os gregos e as amazonas; diversas corridas e guerras entre os lápitas (o povo da antiga Tessália) e os centauros (criaturas míticas, meio homens, meio cavalos); além de outras esculturas. Hoje, alguns restos dessas esculturas e frisos podem ser vistos no Museu Britânico.

No século 15, terremotos abalaram a fundação do mausoléu, que despencou lentamente. Por volta de 1494, os Cavaleiros de São João de Malta usaram os restos do tempo para reforçar seu castelo. Eles também queimaram colunas de mármore para criar argamassa.

Escavações no mausoléu localizaram coisas bastante interessantes. Em 1522, Charles Guichard localizou a câmara de sepultamento de Artemísia, que continua um sarcófago de alabastro - mas, misteriosamente, nenhum cadáver. A equipe dinamarquesa que escavou o local no fim dos anos 60 encontrou restos de ovos, pombas, carneiros e bois, provavelmente oferecidos ao rei e rainha como alimentos para depois da morte.

Fontes: History Channel; Princeton; HistoriaMais.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Belle de Jour

Catherine Deneuve in "Belle de Jour" [1967]

Eu lembro da moça bonita / Da praia de Boa Viagem / E a moça no meio da tarde / De um domingo azul / Azul, era Belle de Jour / Era a bela da tarde / Seus olhos azuis como a tarde / Na tarde de um domingo azul / La Belle de Jour!... (Alceu Valença)

Copa do Mundo 1934

A conquista da seleção dona da casa é usada como propaganda para o regime fascista. Ganhar a Copa do Mundo que sediaria era um ponto de honra para a Itália de Benito Mussolini. O fascismo avançava na Europa e a vitória dos italianos seria propaganda desse regime autoritário.

Para garantir o melhor time possível, Mussolini mudou leis para facilitar a naturalização de bons jogadores descendentes de italianos que nasceram em outros países. Pela primeira vez, o número de países inscritos (32) superou o número de vagas (16), obrigando o início do sistema de eliminatórias.

O Uruguai, campeão em 1930, boicotou o torneio em protesto à ausência da maioria das seleções européias na primeira Copa. O torneio adotou o sistema de eliminatória simples, do tipo "perdeu, cai fora". Nenhum país das Américas venceu na estréia. O maior adversário da Itália foi a Espanha, considerada por muitos o melhor time da Copa. Para vencê-lo, a Itália jogou 210 minutos: 1 a 1 na primeira partida (com prorrogação) e 1 a 0 no jogo-desempate. Na final, com o time cansado, a Itália venceu a Tchecoslováquia por um minguado 2 a 1.


Seleção brasileira decepciona

Outra briga, desta vez entre profissionais e amadores, enfraqueceu o Brasil para a Copa da Itália. A CBD, amadora, teve dificuldade para montar uma boa seleção, pois surgira uma nova entidade – a Federação Brasileira de Futebol, profissional. A maioria dos bons jogadores brasileiros atuava em clubes profissionais, filiados à FBF. Não houve acordo para uma trégua durante a Copa. A solução foi negociar diretamente com os jogadores. A CBD aliciou Leônidas (Vasco), Luizinho e Waldemar de Brito (São Paulo), entre outros. Os clubes profissionais eram contra: o Palestra Itália (hoje Palmeiras) escondeu seus jogadores em uma fazenda.

Espanha 3 x 1 Brasil, a defesa da Espanha desceu a bota nos brasileiros: quatro contra um.
A campanha foi curta. O Brasil foi eliminado na estréia, em Gênova, pela forte seleção espanhola: 3 a 1. Com 30 minutos de jogo, os espanhóis já venciam por 3 a 0, dois gols de Langara e um de Irarogorri, de pênalti. No segundo tempo, o Brasil melhorou. Leônidas pegou um rebote do goleiro Zamora e descontou aos 7 min. Oito minutos depois, Luizinho teve um gol anulado pelo juiz alemão Birlem, por impedimento. Aos 25 min, Waldemar de Brito desperdiçou um pênalti, defendido pelo grande Zamora. Waldemar se redimiria muito mais tarde: foi ele quem descobriu o talento de Pelé.

Na Copa de 1934, a estréia do Brasil foi também a despedida: Espanha 3 x 1

Curiosidades

Lenço na cabeça - O atacante italiano Luigi Bertolini, melhor cabeceador da Europa, disputou a Copa com seu tradicional lenço branco amarrado na cabeça. As bolas tinham costuras externas grosseiras que machucavam a testa do jogador.

Brasileiro campeão - Anfilogino Guarisi, o Filó, brasileiro que jogou no ataque do Corinthians, foi um dos italianos naturalizados no time campeão.

Comentário - "Ides para um país que se renova moral e materialmente. O italiano, que se sentia deprimido antes do advento do fascismo, sente-se agora orgulhoso de sua própria raça. É esse o exemplo que deve guiar os esportistas brasileiros". De Getúlio Vargas, então presidente, à delegação que seguia para a Itália.

Informações gerais

Participantes - 16
Anfitrião - Itália
Período - 27 de Maio – 10 de Junho
Gols - 70 (média de 4,1)
Campeão - Itália
Vice-campeão - Tchecoslováquia
Artilheiro - Oldřich Nejedlý (Tchecoslováquia), 5 gols
Maior goleada - Itália 7 – 1 Estados Unidos - Stadio Nazionale PNF, Roma, 27/5
Público - 358.000 (média de 21.058)

Classificação: 1º - Itália / 2º - Tchecoslováquia / 3º - Alemanha / 4º - Áustria

A Seleção Italiana posando antes da final. Em pé, da esquerda para a direita, estão Combi, Monti, Ferraris IV, Allemandi, Guaita e Ferrari; agachados, Schiavio, Meazza, Monzeglio, Bertolini e Orsi
A campanha do campeão:

Oitavas-de-final
27/5 Itália 7 x 1 Estados Unidos
Quartas-de-final
31/5 Itália 1 x 1 Espanha
31/5 Itália 1 x 0 Espanha
Semifinal
3/6  Itália 1 x 0 Áustria
Final
10/6 Itália 2 x 1 Tchecoslováquia

Fonte: http://www.cassio.com.br/bolabrasil/copa1934.html

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A ruivinha que encantou Elvis

Cantora, atriz, extrovertida e ruiva, virou símbolo sexual de hollywood dos anos 60. Ann Margret Olsson nasceu em Valsjobyn, Suécia, em 28/04/1941. Mudou-se muito jovem para os EUA. No cinema teve atuações marcantes e foi par de Elvis Presley no filme “Amor a Toda Felicidade”, no ano de 1964.

Barbara Bach, a bond-girl

Barbara Bach, atriz e modelo, nasceu em Queens, Nova Iorque, em 27 de agosto de 1947. Foi esposa do ex-baterista dos Beatles, Ringo Starr. Conseguiu fama como a bond-girl de "007 O Espião Que Me Amava", terceiro filme da série de James Bond dos estrelados por Roger Moore e que a transformaria numa sex symbol internacional.

O enigma da Pedra da Gávea

A Pedra da Gávea se situa entre a Barra da Tijuca e São Conrado, no Rio de Janeiro. Encontrava-se originalmente no bairro da Gávea, ao qual cedeu o nome, antes que os seus limites administrativos fossem redefinidos. Com topo de granito subindo 842 metros acima do nível do mar, é o maior bloco de pedra a beira mar do planeta. Conhecida como uma esfinge de histórias contraditórias, desperta admiração pela imponência e mistério. É um dos pontos extremos do parque da Floresta da Tijuca e um dos mirantes mais espetaculares, situado entre São Conrado, na Zona Sul e Barra da Tijuca, na Zona Oeste.

O batismo da Pedra da Gávea remonta à épica expedição do capitão Gaspar de Lemos, iniciada em 1501, de que participou igualmente Américo Vespúcio, e na qual também o Rio de Janeiro recebeu sua denominação. Foi a primeira montanha carioca a ser batizada com um nome em português, após ter sido avistada, no primeiro dia de janeiro de 1502 pelos seus marujos, que reconheceram em sua silhueta o formato de um cesto de gávea.

A Teoria da Tumba Fenícia

Tudo começa no século XIX. Algumas "marcas" na rocha chamaram a atenção do Imperador D. Pedro I, apesar de seu pai, D. João VI, rei de Portugal, já ter recebido um relatório de um padre falando sobre as marcas estranhas, as quais foram datadas de antes de 1500. Até 1839, pesquisas oficiais foram conduzidas, e no dia 23 de março, em sua 8° (oitava) seção extraordinária, o Instituto Histórico e Geográfico do Brasil decidiu que a Pedra da Gávea deveria ser extensamente analisada, e ordenou então o estudo do local e suas inscrições.

Uma pequena comissão foi formada para estudar a rocha. 130 anos mais tarde, o jornal O Globo questionou tal comissão, querendo saber se eles realmente escalaram a rocha, ou se eles simplesmente estudaram-na usando binóculos.

O relatório fornecido pelo grupo de pesquisa diz que eles "viram as inscrições e também algumas depressões feitas pela natureza." No entanto, qualquer um que veja estas marcas de perto irá concordar que nenhum fenômeno natural poderia ter causado estas inscrições.

Após o primeiro relatório, ninguém voltou a falar oficialmente sobre a Pedra até 1931, quando um grupo de excursionistas formou uma expedição para achar a tumba de um rei fenício que subiu ao trono em 856 a.C. Algumas escavações amadoras foram feitas sem sucesso. Dois anos depois, em 1933, um grupo de escaladas do Rio de Janeiro organizou uma expedição gigantesca com 85 membros, o qual teve a participação do professor Alfredo dos Anjos, um historiador que deu uma palestra "in loco" sobre a "Cabeça do Imperador" e suas origens.

Em 20 de janeiro de 1937, este mesmo clube organizou outra expedição, desta vez com um número ainda maior de participantes, com o objetivo de explorar a face e os olhos da cabeça até o topo, usando cordas. Esta foi a primeira vez que alguém explorava aquela parte da rocha depois dos fenícios, se a lenda está correta.

Segundo um artigo escrito em 1956, em 1946 o Centro de Excursionismo Brasileiro conquistou a orelha direita da cabeça, a qual está localizada a uma inclinação de 80 graus do chão e em lugar muito difícil de chegar. Qualquer erro e seria uma queda fatal de 20 metros de altura para todos os exploradores. Esta primeira escalada no lado oeste, apesar de quase vertical, foi feita virtualmente a "unha". Ali, na orelha, há a entrada para uma gruta que leva a uma longa e estreita caverna interna que vai até ao outro lado da pedra.

Em 1972, escaladores da Equipe Neblina escalaram o "Paredão do Escaravelho" - a parede do lado leste da cabeça - e cruzaram com as inscrições que estão a 30 metros abaixo do topo, em lugar de acesso muito difícil. Apesar do Rio ter uma taxa anual de chuvas muito alta, as inscrições ainda conservavam-se quase intactas.


Em 1963 um arqueólogo e professor de habilidade científica chamado Bernardo A. Silva Ramos traduziu-as como:

LAABHTEJBARRIZDABNAISINEOFRUZT

Que lidas ao contrário:

TZUR FOENISIAN BADZIR RAB JETHBAAL

Ou:

TIRO, FENÍCIA, BADEZIR PRIMOGÊNITO DE JETHBAAL

Fatos e Estórias Sobre a Pedra   

A grande cabeça com dois olhos (não muito profundos e sem ligação entre eles) e as orelhas; As enormes pedras no topo da cabeça a qual lembra um tipo de coroa ou adorno; Uma enorme cavidade na forma de um portal na parte nordeste da cabeça que tem 15 metros de altura e 7 metros de largura e 2 metros de profundidade; Um observatório na parte sudeste como um dolmen, contendo algumas marcas; Um ponto culminante como uma pequena pirâmide feita de um único bloco de pedra no topo da cabeça;    As famosas e controversas inscrições no lado da rocha; Algumas outras inscrições lembrando cobras, raios-solares, etc, espalhados pelo topo da montanha; O local de um suposto nariz, que teria caído há muito tempo atrás.

Roldão Pires Brandão, o presidente da Associação Brasileira de Espeleologia e Pesquisas Arqueológicas no Rio afirmou: "É uma esfinge gravada em granito pelos fenícios, a qual tem a face de um homem e o corpo de um animal deitado. A cauda deve ter caído por causa da ação do tempo. A rocha, vista de longe, tem a grandeza dos monumentos faraônicos e reproduz, em um de seus lados, a face severa de um patriarca". (O GLOBO)

Hoje já se sabe que em 856 a.C., Badezir tomou o lugar de seu pai no trono real de Tiro. Será a Pedra da Gávea o túmulo deste rei?

Segundo consta, outros túmulos fenícios que foram encontrados em Niterói, Campos e Tijuca sugerem que esse povo realmente esteve aqui. Em uma ilha na costa do Estado da Paraíba, pedras ciclope e ruínas de um castelo antigo com quartos enormes e diversos corredores e passagens foi encontrado. De acordo com alguns especialistas, o castelo seria uma relíquia deixada pelos fenícios, apesar de haver pessoas que contextem essa teoria.

Robert Frank Marx, um arqueólogo americano interessado em descobrir provas de navegantes pré-colombianos no Brasil, começou em outubro de 1982, uma série de mergulhos na Baía de Guanabara. Ele queria achar um navio fenício afundado e provar que a costa do Brasil foi, em épocas remotas, visitada por civilizações orientais. Apesar de não achar tal embarcação, o que ele encontrou pode ser considerado um tesouro valioso.

Sobre esta procura, O GLOBO publicou: "O caso dos vasos fenícios na Baía de Guanabara sempre foi tratado com o maior sigilo e seu achado só foi revelado um ano depois, em 1978, com vagas informações. O nome do mergulhador que achou as doze peças arqueológicas só foi revelado ontem, depois de uma conferência no Museu Marinho, pelo presidente da Associação Profissional para Atividades Sub-Aquáticas, Raul Cerqueira."

Três vasos foram encontrados. Um permaneceu com José Roberto Teixeira, o mergulhador que encontrou os vasos, e os outros dois foram para a Marinha. As peças com capacidade para armazenar 36 litros, estão sob a guarda do governo brasileiro em uma localidade desconhecida.

A Escadaria

Existe uma gruta tipo sifão na parte onde o maciço toca o mar, com a parte abobadada acima do mar e com ventilação natural, onde se encontra uma escadaria em sentido ascencional, que segundo consta, levaria ao interior da Pedra. O caso mais conhecido referente a esta escadaria é o de dois rapazes que faziam caça submarina e ao encontrarem a entrada para esta gruta, resolveram entrar. Decidiram subir os degraus da escadaria e a última coisa que se lembram é de perderem os sentidos. Quando acordaram, estavam no topo da pedra a 842 metros de altitude.

Fontes: Acasicos; Wikipedia.

O umbigo do mundo

"Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo."  (c. 650 a.C. - 550 a.C.)
Durante mais de 15 séculos, do nascimento ao fim da cultura grega antiga, o Oráculo de Delfos, ou templo de Apolo, serviu como local onde os peregrinos vindos das mais diversas latitudes do mundo helênico consultavam as pitonisas, as sacerdotisas oraculares, para saber qual o seu destino, da sua família ou da sua pátria. Delfos tornou-se um dos lugares sagrados mais venerados pelos gregos, sendo que suas previsões e predições tiveram enorme repercussão nos destinos de reis, de tiranos e de muita outra gente famosa daqueles tempos..

Situado na Grécia, no que foi a antiga cidade chamada Delfos (que hoje já não existe), no sopé do monte Parnaso, nas encostas das montanhas da Fócida, a 700 m sobre o nível do mar e a 9,5 km de distância do golfo de Corinto.

Delfos era um recinto e um complexo de construções num terreno sagrado para os antigos gregos, onde se realizavam os Jogos Píticos e havia um templo consagrado ao deus Apolo, originalmente consagrado à Pítia. Neste templo, as sacerdotisas de Apolo (Pitonisa) faziam profecias em transes. As respostas e profecias ali obtidas eram consideradas verdades absolutas. Hoje, suspeita-se que os transes e visões das sacerdotisas eram provocados por gases emitidos por uma fenda subterrânea no local.

Das rochas da montanha circundante brotam várias nascentes que formam fontes. Uma das fontes mais conhecidas desde tempos muito antigos era a fonte de Castália, rodeada de um bosque de loureiros consagrado ao deus Apolo. A lenda e a mitologia contam que no monte Parnaso e próximo desta fonte se reuniam algumas divindades, deusas menores do canto e da poesia, chamadas musas, e as ninfas das fontes, chamadas náiades. Nestas reuniões Apolo tocava a lira e as divindades cantavam. Conta-se que o oráculo de Delfos ganhou tamanho significado mágico após o deus Apolo matar a serpente Phyton neste local, daí que se deriva o nome das sacerdotisas (pitonisas).

O oráculo de Delfos influenciou significativamente a colonização grega das costas do sul da Itália e da Sicília. Chegou a ser o centro religioso do mundo helênico.

A Fócida ou Fócia é uma antiga região do centro da Grécia atravessada pelo grande maciço do monte Parnaso. Na época da Grécia clássica uma parte desta região, a que está situada junto desse monte, tinha o topónimo de Pyto (ou Pito), em grego Πυθω. Este lugar é conhecido como Delfos, ou seja, Pyto e Delfos são sinônimos. O porto de Itea era o acesso por mar mais próximo de Delfos.

O recinto inclui ainda os chamados tesouros (θεσαυρυς), que eram pequenas construções semelhantes a capelas onde se guardavam os ex-votos e os donativos que frequentemente eram muito valiosos. Sabe-se que existiam estes tesouros: tesouro de Siracusa, tesouro de Cirenea, tesouro de Cnido, tesouro de Sifnos, tesouro de Sición (muito importante), tesouro de Tebas, tesouro de Corinto, tesouro dos etruscos e tesouro dos atenienses (o único restaurado).

Fontes: Wikipedia; Educaterra.

O terrível velho

Era intenção de Ângelo Ricci, Joe Czanek e Manuel Silva fazerem uma visita ao Velho Ruim. Esse ancião morava sozinho em uma casa antiguíssima na Rua d’Água, perto do mar, e tinha a reputação de ser ao mesmo tempo muito rico e muito frágil.

Tratava-se de uma combinação de qualidades muito atraentes para homens da profissão dos senhores Ricci, Czanek e Silva, que ganhavam a vida praticando aquela atividade que o tempo dignificou: o roubo.

Os habitantes de Kingsport diziam e pensavam muitas coisas sobre o Velho Ruim que, em geral, o mantinham a salvo das atenções de cavalheiros como o Sr. Ricci e seus companheiros, apesar do fato quase certo de que ele ocultava uma fortuna de grandeza indefinida em algum local de sua morada bolorenta e venerável. Com efeito, era pessoa estranhíssima, de quem se acreditava ter sido no passado capitão de clípere das Índias Orientais; era tão velho que ninguém se lembrava do tempo em que era jovem, e tão taciturno que poucos conheciam seu verdadeiro nome.

Entre as árvores retorcidas do pátio fronteiro de sua vetusta e desleixada vivenda, ele conservava uma estranha coleção de grandes pedras, agrupadas de maneira esquisita e pintadas de modo a se assemelharem aos ídolos de um obscuro templo oriental. Essa coleção afugentava, amedrontados, a maioria dos meninos que gostavam de implicar com o Velho Ruim por causa de seus cabelos e de sua barba branca, ou de quebrar as janelas de pequenas vidraças de sua casa com perversos petardos.

No entanto, haviam outras coisas que assustavam as pessoas mais velhas e mais curiosas que às vezes se esgueiravam até a casa para olhar pelas vidraças empoeiradas. Diziam essas pessoas que sobre uma mesa no andar térreo viam-se várias garrafas singulares, cada uma delas tendo em seu interior um pedacinho de chumbo suspenso por um fio, à guia de pêndulo. E diziam que o Velho Ruim conversava com essas garrafas, dirigindo-se a elas por nomes como Jack, Cicatriz, Tomazão, Zé Espanhol, Peters e Imediato Ellis, e que sempre que falava a uma das garrafas, o pequenino pêndulo de chumbo em seu interior produzia certas vibrações claras, como se respondesse.

Aqueles que tinham visto o Velho Ruim, alto e macérrimo, mantendo essas esquisitas palestras não procuravam olhá-lo de novo. Mas Angelo Ricci, Joe Czanek e Manuel Silva não tinham sangue de Kingsport; pertenciam àquela geração alienígena, nova e heterogênea, que se situava fora do cativante círculo da vida e das tradições da Nova Inglaterra, e viam no Velho Ruim tão somente um barbudo trôpego e quase caduco, incapaz de caminhar sem a ajuda de sua bengala nodosa e cujas mãos magras e débeis tremiam deploravelmente. A seu modo, na verdade até compadeciam-se daquele sujeito solitário e impopular, de quem todos fugiam e para quem os cães ladravam de maneira singular. Entretanto, trabalho é trabalho, e para um ladrão que dedicou sua alma à profissão há uma atração e um desafio em um homem idoso e débil que não tinha conta no banco e que pagava suas poucas compras na loja da cidade com ouro e prata da Espanha, cunhada há dois séculos.

Os senhores Ricci, Czanek e Silva escolheram para sua visita a noite de 11 de abril. O senhor Ricci e o senhor Silva deveriam entrevistar-se com o infeliz cavalheiro, enquanto o senhor Czanek esperaria, a eles e à sua carga, presumivelmente metálica, com um carro na Rua do Cais, ao lado do portão do alto muro nos fundos da casa do ancião. Foi o desejo de evitar explicações desnecessárias no caso de inesperadas intrusões da força policial que levou a esse plano de partida serena e sem alarde. Tal como combinado, os três aventureiros puseram-se a caminho separadamente, a fim de evitar quaisquer suspeitas malévolas posteriores.

Os senhores Ricci e Silva se encontraram no portão de entrada da casa, na Rua d’Água, e embora não gostassem nada da maneira como a lua brilhava, iluminando as pedras pintadas através dos galhos florescentes das árvores retorcidas, tinham coisas mais importantes em que pensar além de tolas superstições. Temiam que fossem obrigados a tarefas desagradáveis para obrigar o Velho Ruim a se mostrar loquaz a respeito de seu tesouro de ouro e prata, pois os velhos lobos-do-mar são notavelmente cabeça-dura e avarentos.

Mas, afinal, ele era velhíssimo e debilitadissimo e havia dois visitantes. Os senhores Ricci e Silva eram experientes na arte de persuadir pessoas obstinadas, e os gritos de um homem fraco e excepcionalmente venerável poderiam ser abafados com facilidade. Assim refletindo, chegaram até uma janela iluminada e ouviram o Velho Ruim conversar infantilmente com suas garrafas com pêndulos. Depois, colocaram máscaras e bateram cortesmente na porta de carvalho, manchada pelo tempo.

A espera pareceu interminável ao Sr. Czanek, que se remexia, impaciente, no carro coberto junto ao portão dos fundos da casa do Velho Ruim, na Rua do Cais. Tinha o coração mais sensível do que o dos comuns mortais, e não apreciou em nada os gritos medonhos que ouviu na casa antiga, pouco depois da hora aprazada para a visita. Não havia ele recomendado aos colegas que mostrassem a maior gentileza possível para com o patético ex-capitão? Nervoso, ele vigiava aquela estreita porta de carvalho no muro revestido de hera. Freqüentemente consultava o relógio e se admirava com a demora. Haveria o ancião morrido antes de revelar onde ocultara seu tesouro, tornando forçosa uma busca rigorosa?

Ao Sr. Czanek não agradava esperar tanto tempo no escuro e em tal local. Percebeu então passadas suaves ou arrastar de pés no caminho do outro lado do portão, ouviu que abriam de leve a tranca enferrujada e viu a porta, estreita e pesada, abrir-se para o lado de dentro. E à luz pálida da única luz da rua, esforçou-se para ver o que os colegas tinham trazido de dentro daquela casa sinistra, que parecia agora maior do que nunca. Entretanto, ao olhar, não viu aquilo que havia esperado; pois não eram seus camaradas que estavam ali, mas apenas o Velho Ruim, apoiado serenamente em sua bengala nodosa e tendo nos lábios um sorriso tétrico. O Sr. Czanek jamais havia notado a cor dos olhos daquele homem; eram amarelos.

Coisas pequenas causam considerável agitação em cidadezinhas, e foi por isso que a gente de Kingsport falou durante toda aquela primavera e todo aquele verão a respeito dos três corpos que haviam sido trazidos pela maré, impossíveis de identificar, horrivelmente dilacerados, como por obra de muitos cutelos, e horrivelmente mutilados, como que pisados por muitas botas cruéis. E algumas pessoas até se detiveram a falar e fatos triviais como o carro abandonado que havia sido encontrado na Rua do Cais, ou de alguns gritos notavelmente inumanos, provavelmente de algum animal extraviado ou de um pássaro migrante, ouvido de noite por cidadãos despertos.

Mas por todo esse disse-me-disse ocioso de cidade pequena, o Velho Ruim não demonstrou qualquer interesse. Era, por sua própria natureza, pessoa reservada, e quando se é idoso e débil, as reservas naturais sem dúvida redobram. Ademais, um lobo-do-mar tão entrado em anos só podia ter sido testemunhas de vintenas de fatos muito mais excitantes, nos dias longínquos de sua juventude já esquecida.


O medo

Subimos ao tombadilho depois do jantar. Diante de nós, o Mediterrâneo não apresentava a mínima ondulação em toda a sua superfície, iluminado por uma lua grande e plácida. O grande barco deslizava, atirando ao céu semeado de estrelas uma enorme serpente de fumaça negra; e, atrás de nós, a água, toda branca, agitada pela rápida passagem da pesada embarcação, castigada pela hélice, espumava e parecia contorcer-se, desmanchando-se em tantos clarões que se diria que o luar borbulhava.

Éramos seis ou oito que ali nos encontrávamos, silenciosos, em contemplação, o olhar voltado para a África longínqua para onde nos dirigíamos. O comandante, que fumava um charuto conosco, retomou subitamente a conversa do jantar.

"Sim, tive medo naquele dia. Meu navio permaneceu seis horas com o rochedo encravado no bojo, sacudido pelo mar. Felizmente, fomos recolhidos à tarde por um carvoeiro inglês que nos avistara."

Então, um homem alto, de rosto tisnado e aspecto grave, um desses homens que nos dão a impressão de terem atravessado vastos e desconhecidos países, no meio de perigos constantes, e cujo olhar tranqüilo parece conservar, lá no fundo, algo das paisagens estranhas que viu, um desses homens que adivinhamos forjados na coragem, falou pela primeira vez:

"Comandante, o senhor diz que teve medo; não acredito nisso. Engana-se em relação ao sentido da palavra e à sensação que experimentou. Um homem enérgico jamais sente medo diante de um perigo iminente. Fica emocionado, agitado, ansioso; mas o medo é outra coisa".

O comandante replicou, rindo:

"Essa agora! Garanto-lhe que tive medo, sim".

Então, o homem de tez bronzeada falou com voz lenta:

- Permitam-me que me explique! O medo (e os homens mais valentes podem sentir medo) é algo terrível, uma sensação atroz, uma espécie de dilaceramento da alma, um tremendo espasmo da inteligência e do coração, cuja simples lembrança nos faz estremecer de angústia. Mas, quando se é corajoso, isso não acontece diante de um ataque, nem diante da morte inevitável, nem diante de qualquer das formas conhecidas do perigo; isso acontece em determinadas circunstâncias anormais, sob determinadas influências misteriosas e diante de riscos vagos. O verdadeiro medo é algo como uma reminiscência dos terrores fantásticos de outrora. Um homem que acredita em fantasmas e que imagina ver espectros à noite deve sentir o medo em todo o seu medonho horror.

Quanto a mim, descobri o medo em pleno dia, há cerca de dez anos. Tornei a senti-lo durante o inverno passado, numa noite de dezembro.

E, no entanto, passei por muitos perigos, por muitas aventuras que pareciam mortais. Lutei muitas vezes. Fui largado como morto por ladrões. Na América, fui condenado à forca como insurreto, e fui atirado ao mar do tombadilho de um navio, nas costas da China. Em cada uma dessas ocasiões, julguei-me perdido e resignei-me à situação sem sentir compaixão nem lamentar-me.

Mas o medo não é isso.

Pressenti-o na África. Entretanto, ele é filho do Norte; o sol dissipa-o como a um nevoeiro. Reparem bem, senhores. Para os orientais, a vida não tem valor; a resignação é fácil; as noites são límpidas e sem lendas, as almas igualmente livres das sombrias inquietações que perseguem os cérebros nos países frios. No Oriente, podem conhecer o pânico, mas ignoram o medo.

Pois bem, eis o que me aconteceu nas terras da África:

Eu atravessava as grandes dunas ao sul de Ouargla. É uma das mais estranhas regiões do mundo. Os senhores conhecem a areia compacta, a areia lisa das intermináveis praias do oceano. Pois bem! Imaginem o próprio oceano transformado em areia em meio a um furacão; imaginem uma tempestade silenciosa de vagas imóveis de poeira amarela. São altas como montanhas, essas vagas desiguais, estranhas, erguidas como ondas desencadeadas, porém maiores ainda e estriadas como o chamalote. Sobre esse mar furioso, mudo e imóvel, o sol meridional, incandescente, incide sua chama implacável e direta. É preciso escalar essas vagas de cinza dourada, descer, tornar a subir, subir o tempo todo, sem descanso nem sombra. Os cavalos arquejam, afundam até os joelhos, e escorregam ao descer a outra vertente dessas surpreendentes colinas.

Éramos dois amigos acompanhados por oito spahis e quatro camelos com os respectivos cameleiros. Não falávamos mais, prostrados de calor e fadiga, e ressequidos pela sede como esse deserto ardente. De súbito, um dos nossos homens soltou uma espécie de grito; todos pararam e permanecemos imóveis, surpreendidos por um inexplicável fenômeno conhecido pelos viajantes daquelas regiões perdidas.

Em algum lugar, perto de nós, numa direção indeterminada, um tambor rufava, o misterioso tambor das dunas; rufava distintamente, ora mais forte, ora mais fraco, parando e depois recomeçando seu rufar fantástico.

Os árabes olhavam-se apavorados e um deles disse na sua língua: "A morte paira sobre nós". E eis que, inesperadamente, meu companheiro, meu amigo, quase meu irmão, caiu do cavalo, de cabeça, fulminado por uma insolação.

E durante duas horas, enquanto em vão eu tentava salvá-lo, esse tambor invisível encheu-me os ouvidos com seu rufar monótono, intermitente e incompreensível; e, diante desse morto querido, naquele buraco incendiado pelo sol, entre quatro montes de areia, eu sentia o medo insinuar-se dentro dos meus ossos, o verdadeiro medo, o horrível medo, enquanto o eco desconhecido nos trazia, a duzentas léguas de qualquer aldeia francesa, o rufar rápido do tambor.

Naquele dia compreendi o que era sentir medo; soube-o ainda melhor numa outra vez...

O comandante interrompeu o narrador:

"Perdão, senhor, mas esse tambor? O que era?

O viajante respondeu:

- Não sei. Ninguém sabe. Os oficiais, surpreendidos muitas vezes por esse ruído singular, atribuem-no geralmente ao eco ampliado, multiplicado, desmesuradamente aumentado por aquela série de pequenos vales formados nas dunas, eco formado pelas saraivadas de grãos de areia carregados pelo vento que esbarram em tufos de ervas secas; pois sempre se observou que o fenômeno ocorre nas proximidades daquelas plantinhas queimadas pelo sol e duras como pergaminho.

Esse tambor, portanto, não passaria de uma espécie de miragem sonora. Aí está. Mas só soube disso mais tarde.

Chego à minha segunda emoção.

Foi no inverno passado, numa floresta a nordeste da França. A noite chegou duas horas mais cedo, de tal modo o céu estava sombrio. Tinha por guia um camponês que caminhava ao meu lado por uma trilha muito estreita, sob uma abóbada de abetos através de cuja ramagem uivava um vento furioso. Por entre a copa das árvores, via nuvens correndo em desordem, nuvens enlouquecidas que pareciam fugir de algo aterrador. Às vezes, sob uma rajada violenta, toda a floresta se inclinava na mesma direção com um gemido de dor: e o frio me invadia, apesar do meu passo rápido e das minhas roupas pesadas.

Devíamos cear e dormir na casa de um guarda florestal da qual nos aproximávamos. Eu ia lá para caçar.

Às vezes, meu guia erguia os olhos e murmura: "Que tempo horrível!" Depois falou-me das pessoas da casa para onde íamos. Dois anos antes, o pai matara um caçador furtivo e desde então se tornara taciturno, como que perseguido por uma recordação. Tinha dois filhos casados que viviam em sua companhia.

As trevas eram cerradas. Nada via à minha frente nem à minha volta, e a ramagem das árvores que se entrechocavam enchia a noite de um contínuo sussurro. Enfim, avistei uma luz e meu companheiro não tardou em bater a uma porta. Responderam-nos gritos agudos de mulheres. Depois, uma voz de homem, uma voz abafada, perguntou: "Quem vem lá?" Meu guia se identificou. Entramos. O que se viu, então, foi um quadro inesquecível.

Um velho de cabelos brancos, olhar de louco, com uma espingarda engatilhada na mão, esperava-nos de pé no meio da cozinha, enquanto dois robustos rapazes armados de machados guardavam a porta. Divisei duas mulheres ajoelhadas em cantos sombrios, o rosto voltado contra a parede.

Explicamo-nos. O velho tornou a encostar a arma na parede e mandou preparar o meu quarto; depois, como as mulheres não se movessem, disse-me bruscamente:

"Veja, senhor, matei um homem faz dois anos nesta noite. No ano passado ele voltou para chamar-me. Espero-o ainda esta noite".

E acrescentou num tom que me fez sorrir:

"Por causa disso não estamos tranqüilos".

Tranqüilizei-o como pude, feliz por ter vindo justamente naquela noite e assim assistir ao espetáculo desse terror supersticioso. Contei algumas histórias e quase cheguei a acalmar todos eles.

Junto à lareira, um velho cão, bigodudo e quase cego, um desses cães que se parecem com conhecidos nossos, dormia com o focinho entre as patas.

Lá fora, a tempestade enfurecida sacudia a pequena casa e, através de uma estreita vidraça, colocada junto à porta, eu via, de repente, à luz de grandes relâmpagos, o arvoredo açoitado pelo vento.

Apesar dos meus esforços, percebia que um terror profundo dominava aquelas pessoas e, sempre que parava de falar, todos os ouvidos escutavam ao longe. Cansado de assistir a medos imbecis, ia pedir para me deitar quando, de súbito, o velho guarda saltou de sua cadeira, tornou a apanhar a espingarda, balbuciando com uma voz alucinada:

"Ele está aqui! Ele está aqui! Ouço-o". As duas mulheres tornaram a cair de joelhos em seus cantos, escondendo o rosto; e os filhos voltaram a pegar nos machados. Ia tentar novamente acalmá-los quando o cão adormecido despertou de repente, levantou a cabeça, esticou o pescoço e, fitando o fogo com seus olhos quase cegos, soltou um desses uivos lúgubres que fazem estremecer os viajantes quando passam à noite pelos campos. Todos os olhos voltaram-se para ele, que agora permanecia imóvel, erguido sobre as patas como que perseguido por uma visão, uivando para qualquer coisa invisível, desconhecida, medonha sem dúvida, pois tinha o pêlo todo eriçado. O guarda, lívido, gritou: "Ele o está sentindo! Ele o está sentindo! Ele estava lá quando o matei". E as duas mulheres, desvairadas, começaram a uivar junto com o cão.

Involuntariamente, um grande arrepio percorreu-me a espinha. A alucinação do animal, naquele lugar, àquela hora, no meio daquela gente alucinada, era um espetáculo medonho.

Então, durante uma hora, o cão uivou sem se mover; uivou como na angústia de um pesadelo; e o medo, o horrível medo, apoderou-se de mim. Medo de quê? Será que sei? Era o medo, eis tudo.

Permanecíamos imóveis, lívidos, na expectativa de algo pavoroso, o ouvido atento, o coração agitado, sobressaltando-nos ao menor ruído. E o cão começou a andar em torno da sala, farejando as paredes e continuando a ganir. Esse animal nos enlouquecia. De repente, o camponês que me trouxera, tomado por uma espécie de paroxismo de terror, jogou-se sobre ele e, abrindo a porta que dava para um pequeno pátio, enxotou-o.

Imediatamente o cão se calou: e nós ficamos mergulhados num silêncio ainda mais aterrador. Depois, todos nós estremecemos ao mesmo tempo: um ser deslizava contra a parede externa da casa, do lado da floresta; passou pela porta, que pareceu tatear com mãos hesitantes; depois não se ouviu mais nada durante dois minutos que quase nos enlouqueceram; em seguida, tornou a voltar, sempre roçando a parede; e arranhou-a ligeiramente como faria uma criança com a unha; e, subitamente, uma cabeça surgiu atrás da fresta de vidro, uma cabeça branca com olhos luminosos como os das feras. E um som saiu-lhe da boca, um som indistinto, um murmúrio de lamento.

Então, um estrondo formidável ressoou na cozinha. O velho guarda disparara. Imediatamente, os filhos se precipitaram e taparam a fresta, empurrando contra ela a enorme mesa que prenderam com o aparador.

Juro-lhe que, ao ouvir o inesperado tiro, senti uma tal angústia no coração, na alma e no corpo, que me senti desfalecer, prestes a morrer de medo.

E assim ficamos até o nascer do sol, incapazes de fazer um só movimento, de dizer uma única palavra, tomados de um intraduzível pânico.

Ninguém ousou desobstruir a porta a não ser quando percebemos, por uma fenda do alpendre, um tênue raio de luz.

Junto à parede, contra a porta, o velho cão jazia, a garganta despedaçada por uma bala.

Saíra do pátio cavando um buraco por baixo da cerca.

O homem de rosto moreno calou-se; depois acrescentou:

"Nessa noite, entretanto, não corri nenhum perigo; mas preferiria reviver todas as horas nas quais enfrentei os mais terríveis perigos, ao simples minuto do tiro sobre a cabeça barbuda atrás da fresta envidraçada".

(23 de outubro de 1882)

(Tradução de José Thomas Brum)

por Guy de Maupassant

A morta

Eu a amara perdidamente! Por que amamos? É realmente estranho ver no mundo apenas um ser, ter no espírito um único pensamento, no coração um único desejo e na boca um único nome: um nome que ascende ininterruptamente, que sobe das profundezas da alma como a água de uma fonte, que ascende aos lábios, e que dizemos, repetimos, murmuramos o tempo todo, por toda parte, como uma prece.

Não vou contar a nossa história. O amor só tem uma história, sempre a mesma. Encontrei-a e amei-a. Eis tudo.

E vivi durante um ano na sua ternura, nos seus braços, nas suas carícias, no seu olhar, nos seus vestidos, na sua voz, envolvido, preso, acorrentado a tudo que vinha dela, de maneira tão absoluta que nem sabia mais se era dia ou noite, se estava morto ou vivo, na velha Terra ou em outro lugar qualquer.

E depois ela morreu.

Como? Não sei, não sei mais. Voltou toda molhada, nutria noite de chuva, e, no dia seguinte, tossia. Tossiu durante cerca de uma semana e ficou de cama.

O que aconteceu? Não sei mais.

Médicos chegavam, receitavam, retiravam-se. Traziam remédios; uma mulher obrigava-a a tomá-los. Tinha as mãos quentes, a testa ardente e úmida, o olhar brilhante e triste. Falava-lhe, ela me respondia. O que dissemos um ao outro? Não sei mais. Esqueci tudo, tudo, tudo! Ela morreu, lembro-me muito bem do seu leve suspiro, tão fraco, o último. A enfermeira exclamou: "Ah! Compreendi, compreendi!"

Não soube de mais nada. Nada. vi um padre que falou assim: "Sua amante." Tive a impressão de que a insultava. Já que estava morta, ninguém mais tinha o direito de saber que fora minha amante. Expulsei-o. Veio outro que foi muito bondoso, muito terno. Chorei quando me falou dela.

Consultaram-me sobre mil coisas relacionadas com o enterro. Não sei mais. Contudo, lembro-me muito bem do caixão, do ruído das marteladas quando a enterraram lá dentro. Ah! meu Deus!

Ela foi enterrada! Enterrada! Ela! Naquele buraco! Algumas pessoas tinham vindo, amigas. Caminhei durante muito tempo pelas ruas. Depois voltei para a casa. No dia seguinte, parti para uma viagem.

Ontem, regressei a Paris.

Quando revi o meu quarto, o nosso quarto, a nossa cama, os nossos móveis, toda essa casa onde ficara tudo o que resta da vida de um ser depois da sua morte, o desgosto apoderou-se de mim novamente, de uma forma tão violenta que quase abri a janela para atirar-me à rua. Não podendo mais permanecer no meio daqueles objetos, daquelas paredes que a tinham encerrado, abrigado, e que deviam conservar em suas fendas imperceptíveis milhares de átomos seus, da sua carne e da sua respiração, peguei meu chapéu para sair. De súbito, ao atingir a porta, passei diante do grande espelho que ela mandara colocar no vestíbulo para mirar-se, dos pés à cabeça, todos os dias antes de sair, para ver se toda a sua toalete lhe ia bem, se estava correta e elegante, das botinas ao chapéu.

E parei, de chofre, diante desse espelho que tantas vezes a refletira. Tantas, tantas vezes, que também deveria ter guardado a sua imagem.

Fiquei lá, de pé, trêmulo, os olhos fixos no vidro liso, profundo, vazio, mas que a contivera toda, que a possuíra tanto quanto eu, tanto quanto o meu olhar apaixonado. Tive a impressão de que amava aquele espelho - toquei-o - estava frio! Ah! recordação! recordação! Espelho doloroso, espelho ardente, espelho vivo, espelho horrível, que inflige todas as torturas! Felizes os homens cujo coração, como um espelho onde os reflexos deslizam e se apagam, esquece tudo o que conteve, tudo o que passou à sua frente, tudo o que se contemplou e mirou na sua feição, no seu amor! Como sofro! Saí e, involuntariamente, sem saber, sem querer, dirigi-me ao cemitério. Encontrei seu túmulo, um túmulo singelo, uma cruz de mármore com algumas palavras: "Ela amou, foi amada, e morreu."

Lá estava ela, embaixo, apodrecendo! Que horror! Eu soluçava, a fronte no chão.

Fiquei lá por muito tempo, muito tempo. Depois, percebi que a noite se aproximava. Então, um desejo estranho, louco, um desejo de amante desesperado apoderou-se de mim. Resolvi passar a noite junto dela, a última noite, chorando no seu túmulo. Mas me veriam, me expulsariam. Que fazer? Fui esperto. Levantei-me e comecei a vagar pela cidade dos desaparecidos. Vagava, vagava. Como é pequena essa cidade ao lado da outra, daquela em que vivemos! Precisamos de casas altas, de ruas, de tanto espaço, para as quatro gerações que vêem a luz ao mesmo tempo, que bebem a água das fontes, o vinho das vinhas e comem o pão das planícies.

E para todas as gerações dos mortos, para toda a série de homens que chegaram até nós, quase nada, um terreno apenas, quase nada! A terra os toma de volta, o esquecimento os apaga. Adeus!

Na extremidade do cemitério habitado, avistei subitamente o cemitério abandonado, onde os velhos defuntos acabam de misturar-se à terra, onde as próprias cruzes apodrecem, e onde amanhã serão colocados os últimos que chegarem. Está cheio de rosas silvestres, de ciprestes negros e vigorosos, um jardim triste e soberbo alimentado com carne humana.

Estava só, completamente só. Agachei-me perto de uma árvore verde. Escondi-me completamente entre os galhos grossos e escuros.

E esperei, agarrado ao tronco como um náufrago aos destroços.

Quando a noite ficou escura, bem escura, deixei o meu abrigo e comecei a caminhar de mansinho, com passos lentos e surdos, por essa terra repleta de mortos.

Vaguei durante muito, muito tempo. Não a encontrava. Braços estendidos, olhos abertos, esbarrando nos túmulos com as mãos, com os pés, com os joelhos, com o peito, e até com a cabeça, eu vagava sem encontrá-la. Tocava, tateava como um cego que procura o caminho, apalpava pedras, cruzes, grades de ferro, coroas de vidro, coroas de flores murchas! Lia nomes com os dedos, passando-os sobre as letras. Que noite! Que noite! Não a encontrava!

Não havia lua! Que noite! Sentia medo, um medo horrível, nesses caminhos estreitos entre duas filas de túmulos! Túmulos! Túmulos! Túmulos. Sempre túmulos! À direita, à esquerda, à frente, à minha volta, por toda parte, túmulos! Sentei-me num deles, pois não podia mais caminhar, de tal forma meus joelhos se dobravam. Ouvia meu coração bater! E também ouvia outra coisa! O quê? Um rumor confuso, indefinível! Viria esse ruído do meu cérebro desvairado, da noite impenetrável, ou da terra misteriosa, da terra semeada de cadáveres humanos? Olhei à minha volta!

Quanto tempo fiquei ali? Não sei. Estava paralisado de terror, alucinado de pavor, prestes a gritar, prestes a morrer.

E, de súbito, tive a impressão de que a laje de mármore onde estava sentado se movia. Realmente, ela se movia, como se a estivessem levantando. Com um salto, precipitei-me para o túmulo vizinho e vi, sim, vi erguer-se verticalmente a laje que acabara de deixar; e o morto apareceu, um esqueleto nu que empurrava a lápide com as costas encurvadas. Eu via, via muito bem, embora a escuridão fosse profunda. Pude ler sobre a cruz:

"Aqui jaz Jacques Olivant, morto aos cinqüenta e um anos de idade. Amava os seus, foi honesto e bom, e morreu na paz do Senhor."

O morto também lia o que estava escrito no seu túmulo. Depois, apanhou uma pedra no chão, uma pedrinha pontiaguda, e começou a raspar cuidadosamente o que lá estava. Apagou tudo, lentamente, contemplando com seus olhos vazios o lugar onde ainda há pouco existiam letras gravadas; e, com a ponta do osso que fora seu indicador, escreveu com letras luminosas, como essas linhas que traçamos com a ponta de um fósforo:

"Aqui jaz Jacques Olivant, morto aos cinqüenta e um anos de idade. Apressou com maus tratos a morte do pai de quem desejava herdar, torturou a mulher, atormentou os filhos, enganou os vizinhos, roubou sempre que pode e morreu miseravelmente."

Quando acabou de escrever, o morto contemplou sua obra, imóvel. E, voltando-me, notei que todos os túmulos estavam abertos, que todos os cadáveres os tinham abandonado, que todos tinham apagado as mentiras inscritas pelos parentes na pedra funerária, para aí restabelecerem a verdade.

E eu via que todos tinham sido carrascos dos parentes, vingativos, desonestos, hipócritas, mentirosos, pérfidos, caluniadores, invejosos, que tinham roubado, enganado, cometido todos os atos vergonhosos, abomináveis, esses bons pais, essas esposas fiéis, esses filhos devotados, essas moças castas, esses comerciantes probos, esses homens e mulheres ditos irrepreensíveis.

Escreviam todos ao mesmo tempo, no limiar da sua morada eterna, a cruel, terrível e santa verdade que todo mundo ignora ou finge ignorar nesta Terra.

Imaginei que também ela devia ter escrito a verdade no seu túmulo. E agora já sem medo, correndo por entre os caixões entreabertos, por entre os cadáveres, por entre os esqueletos, fui em sua direção, certo de que logo a encontraria.

Reconheci-a de longe, sem ver o rosto envolto no sudário.

E sobre a cruz de mármore onde há pouco lera:

"Ela amou, foi amada, e morreu", divisei:

"Tendo saído, um dia, para enganar seu amante, resfriou-se sob a chuva, e morreu".

Parece que me encontraram inanimado, ao nascer do dia, junto a uma sepultura.


(31 de maio de 1887)

(Tradução de José Thomas Brum)

por Guy de Maupassan

A caveira


Onze horas da noite.

Não há luar e a velha cidade de Bartolomeu Bueno é na época iluminada a lampeões de querosene, colocados sobre postes de madeira lavrada, distantes quarenta, cinquenta metros uns dos outros.

Na última casa da rua da Abadia jogam o trinta-e-um, na sala de frente, em torno de mesa redonda, alumiada por castiçais com velas de sebo.

Circundam a mesa o Brito Queirós, o Seixas, o Emílio Bandeira, Pinheiro de Paiva, José Soares e o Seis-e-Meia, apelido por que era conhecido o Antônio da Luz.

Àquela hora uma partida de sensação prende os olhares dos jogadores às mãos do "pé’, o Seixas, que distribui as cartas.

Há um empate carregado e estão sobre a mesa quatrocentos e tantos mil réis. Jogam.

Uns pedem cartas, empalidecem e "passam"; outros pedem-nas também, "filam-nas" e "ficam". Seixas, o último a pedi-las, conta os pontos e "chama" o pessoal. Trinta pontos! Os outros ficaram de 27, 28 e 29; ganha o Seixas.

— Arre! diabo! — exclama, — saí de um buraco com um saldo de duzentos e cinquenta mil réis. Dou metade àquele que tiver a coragem de ir agora ao Cemitério e me trazer uma caveira.

— "Pronto" grita o Bandeira, "bata o cobre que a caveira vem já".

— "Dou-te mais cinquenta", diz Seis-e-Meia.

— "E mais cinquenta meus", acode Pinheiro de Paiva.

— "Pois é já’. "Não saiam daqui que não demoro quinze minutos", retruca o Bandeira, erguendo-se da mesa. Tomou o chapéu e partiu. Mas antes de êle sair, rumou para o lado do Cemitério o Zé Mamão que, do lado de fora, encostado à janela, ouvira toda a conversação.

* * *

Meia-noite. Emílio Bandeira levanta o aldravãe da porta do cemitério de São Miguel e caminha para o monte de caveiras que está ao pé do cruzeiro grande da Metrópole dos mortos de Goiás; agarra uma e, quando se dispõe a partir, rouquenha voz, que parece vir de vetusto mausoléu, diz: "Larga, essa é minha!"

Bandeira sente que se lhe eriçam os cabelos ao ponto de derribar o chapéu; um frio que nunca havia experimentado se avoluma em sua coluna vertebral. Para um momento, indeciso, deixa a caveira no monte e agarra outra. "Larga, essa é minha!" diz outra voz fanhosamente.

Bandeira já não está em si, lança mão de outra… "Larga, essa é minha…"

Transido de medo, ainda raciocina: "se eu for procurar caveira sem dono, estou arranjado; até as mais antigas devem ter os seus proprietários; portanto, o que tenho a fazer é isto — pega na que está mais à mão e dispara…

E a voz fanhosa também dispara a repetir: Larga, essa é minha! Larga essa é minha!…

O nosso herói passa o portão da necrópole e vem pela estrada a baixo como uma bala.

"Larga, essa é minha; larga, essa é minha!…"

A jogatina continua na casa da rua da Abadia. Seixas acaba de ganhar mais uma bolada; mete no bolso o dinheiro, não sem tirar antes uma cédula de cem mil réis, que deixa" sobre a mesa.

"Esta", diz, "será do Bandeira, se entrar aqui com a caveira".

Pinheiro de Paiva e Seis-e-Meia deixam também junto ao dinheiro a quantia que prometeram dar.

Brito Queirós dá cartas, e outra jogada vai começar.

Nisto a porta da sala se abre com estalo.

Como um furacão, entra Emílio Bandeira, que atira sobre a mesa do jogo uma caveira e exclama: "Cá está a caveira e o dono ai vem atrás".

E mete-se para o interior da casa a derribar tudo o que lhe impede a disparada. Os outros deixam a mesa, dinheiro, baralho e tratam de acompanhá-lo casa a dentro.

Zé Mamão aparece à porta; não vê na sala nenhuma pessoa; enfia num dos bolsos a dinheirama que está sobre a mesa, acende um cigarro na vela de sebo mais próxima e sai.

E desce a rua da Abadia a assobiar a Palomita
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Fonte: Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. Ed. Literat. 1962

A mirra

A mirra é um corpo seco de homem que foi amaldiçoado. A terra não come a carne e esta vai ressecando em cima dos ossos.

Um rapaz muito vivo e engraçado entrou num cemitério com seus companheiros e ao sair viu uma mirra. Lembrou-se de dizer, por chiste:

— Está magra de fome. Venha dai cear comigo!

— Irei — disse a mirra, com uma voz fanhosa, toda passando pelo nariz. O rapaz ficou assombrado e foi dali lançar-se aos pés do vigário a quem tudo contou.

— Tens que cumprir o convite. Depois da ceia te convidará e aceitarás sem sinal de medo. Volta cá que te darei outro conselho.

O rapaz preparou a ceia e a mirra foi-lhe bater à porta à meia noite, sentando-se á mesa e comendo até não mais poder. Depois falou para o dono da casa:

— O bem que me recebeste em tua casa, devo retribuir de qualquer modo. Amanhã esperar-te-ei onde me convidaste.

E se foi embora. O rapaz não dormiu e pela manhã estava na casa do vigário que lhe deu um rosário indulgenciado, com o perdão da hora-da–morte e emprestou-lhe a capa com que saía.

O rapaz foi para o cemitério e encontrou a mirra.

— Está bem. Deixa a capa aqui e o rosário de que não tens necessidade lá dentro.

— Não, que está frio e do rosário não me separo!

A mirra teimou e o rapaz não cedeu. Estiveram debatendo esse ponto, quando a mirra declarou:

— Assim não te posso levar para cear comigo Não posso ficar junto da capa dos ministros de Deus e das armas de Nossa Senhora. Vai-te, e não tornes a brincar com os que não vivem…

O rapaz pôs-se fora o mais depressa que pode e nunca mais disse graças com os mortos.
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Fonte: Os melhores contos Populares de Portugal. Organização: Câmara Cascudo. Dois Mundos Editora, 1944.

A corda do diabo

Sinfrônio era um homem riquíssimo, dono de inúmeras propriedades e dispondo de fabulosas somas em ouro. Metendo-se, porém, em maus negócios, empobreceu de repente.

Vendo-se na mais completa miséria, resolveu sair do seu país, procurar uma terra onde não fosse conhecido, e ver se conseguia recuperar a fortuna perdida.

Um dia, atravessando uma planície, encontrou o diabo, a quem não reconheceu, todavia.

— Que tens? perguntou-lhe Satanás, conquanto soubesse perfeitamente bem a causa da tristeza de Sinfrônío.

— Para que dizer-te?— respondeu este. — Não me poderás dar remédio...

— Isso é que não sabes; e, desde já, obrigo-me a tirar-te do embaraço, se te obrigares a fazer tudo quanto eu disser.

Em seguida, vendo que Sinfrõnio estava espantado com aquela proposta, deu-se a conhecer.

O pobre homem não sabia que fazer, mas como se achava desesperado da vida, completamente pobre, resolveu aceitar a proteção de Satanás.

Prometeu ficar-lhe pertencendo, com a condição de enriquecer de novo.

— Pois bem, disse o demônio concluindo o pacto, de hoje em diante sair-te-ás bem de todos os negócios em que te envolveres. Se, entretanto, te achares alguma vez em perigo, bastará dizer “Dom Martinho, socorre-me!” e eu te aparecerei.

O capataz do inferno sumiu-se.

Sinfrônio, continuando viagem, chegou pelo meio da noite, a uma cidade.

Aí, certo de que triunfaria, resolveu roubar.

Em todas as casas que pretendia entrar, mal chegava, as portas abriam-se de par em par, encontrava os moradores profundamente adormecidos, e via à mão objetos preciosos.

Então meteu-se em altas empresas, e tornou-se um bandido célebre, terror de toda a região, saqueando viajantes.

Um dia foi preso.

Mal se viu na prisão, lembrou-se do seu protetor e exclamou:

— Dom Martinho, socorre-me!

O diabo apareceu logo e libertou-o.

Vendo-se livre, Sirifrônio recomeçou na sua antiga existência, cometendo toda a sorte de rapinagens.

Novamente foi preso, mas, como da primeira vez, invocou Satanás.

— Dom Martinho, socorre-me!

O demônio veio, mas Sinfrônio reparou que se demorara um pouco.

— Por que não vieste mais depressa?

— Estava ocupado, limitou-se o diabo a dizer laconicamente.

Mais tarde, depois de novos crimes e terríveis façanhas, o nosso herói caiu nas mãos da justiça.

Do fundo da sua prisão chamou Satanás que não veio.

Passaram-se dias, o processo já estava muito adiantado, e só faltava a sentença, quando finalmente mestre Lúcifer veio libertar o amigo.

Posto em liberdade, o bandido continuou ainda na sua horrível existência de rapinagem, com mais afã que nunca, em vez de se emendar.

Pela quarta vez foi preso, encerrado numa masmorra forte, e guardado por sentinelas.

Sem se inquietar muito, Sinfrônio gritou pelo demônio, segundo haviam combinado.

— Dom Martinho, socorre-me!

Decorreram semanas e semanas, até que, enfim, o juiz pronunciou a sentença, condenando-o à morte.

Marcou-se a data para a execução da sentença. Satanás, faltando à palavra, não acudiu à chamada.

Sinfrônio, escoltado pelo carrasco, e por soldados, caminhou para a praça e subiu à forca.

Foi só então que o capataz do inferno apareceu.

— Toma esta bolsa, disse-lhe ele. Aí, dentro estão vinte contos de réis. Dá-os ao juiz que ele te libertará.

O condenado, chamando o juiz, como que para lhe dizer as suas últimas vontades e confissões, fez-lhe a proposta.

O juiz, magistrado desonesto e avarento, escondeu a corda e disse para o povo:

- Cidadãos: acaba de suceder um fato extraordinário, que pela primeira vez acontece: esquecemos de trazer a corda para enforcar o condenado. A execução fica pois, suspensa. Quem sabe se Deus não quis, por esse modo, mostrar a inocência do réu? Vai rever-se a sentença mas a justiça será feita.

Prepararam-se os executores para reenviar Sinfrônio para a cadeia.



Nesse intervalo o magistrado abriu a bolsa, mas só encontrou uma corda nova, em lugar dos vinte contos de réis.

Voltou-se indignado, exclamando:

— Cidadãos: acaba de aparecer uma. Foi Deus quem a enviou. Este homem é na verdade um bandido. Enforquem-no!

Passaram o laço no pescoço de Sinfrônio, que vendo-se estrangulado, bradou:

— Dom Martinho, socorre-me!

— Ah! disse o demônio aparecendo, eu não posso fazer nada, quando os meus amigos já estão com a corda no pescoço.

É assim que o diabo, fingindo querer salvar-nos, acaba sempre por trazer a corda para nos enforcar.
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Figueiredo Pimentel
(Histórias da baratinha. Rio de Janeiro; Belo Horizonte, Livraria Garnier, 1994, p.103-106 - Biblioteca de Autores Célebres da Literatura Infantil, 2)

A dama pé-de-cabra


Certo dia, D. Diogo Lopez saiu para uma caçada e a meio do seu caminho, depara-se com uma mulher muito formosa, que cantava lindamente.

- Quem sois vós, senhora? Quem sois vós que logo me cativastes? - pergunta D. Diogo Lopez.

Ela sorriu e respondeu:

- Sou uma dama tão nobre como tu.

D. Diogo Lopez, rapidamente se apaixonou perdidamente por ela e disse-lhe:

- Senhora, se casares comigo ofereço-te as minhas terras e os meus castelos.

- Guarda as tuas terras, que precisas delas para cavalgar! - respondeu ela.

- Que posso oferecer-te então para que sejas minha?

Ela não disse nenhuma palavra. De repente, estremeceu:

- A única coisa que me interessa não ma podes dar porque foi um legado da tua mãe.

- E se eu te amar mais do que à minha própria mãe?

Esta lhe disse:

- Nesse caso tens de jurar que não tornas a fazer o sinal da cruz que ela te ensinou em pequeno.

Este estranhou o pedido, mas estava tão apaixonado por ela, que exclamou:

- Seja como queres!

Dito isto D. Diogo levou-a para o castelo. Durante longos anos tudo correu bem, embora D. Diogo tenha reparado que a mulher tinha pés de cabra.

Tiveram dois filhos, D. Inigo e D.ª Sol.

Certa noite ao jantar, devido à morte de um dos cães de caça de D. Diogo provocada pela cadela da sua esposa, D. Diogo esqueceu-se do juramento e benzeu-se...

Foi o suficiente, para a sua esposa se desmanchar em urros pavorosos, ficando a sua pele negra. A mulher parecia um animal horrendo, de boca torta e olhos revirados, erguia-se no ar levando debaixo do seu braço a sua filha D.ª Sol.

D. Diogo estava aterrorizado...

- A minha mulher é o diabo! - exclamou.

Dizendo isto, a mulher soltou o último grunhido e desapareceu por uma brecha junto ao teto.

Desde esse dia nunca mais ninguém no castelo, tornou a pôr a vista em cima da mãe, da filha e da cadela. Desapareceram por artes mágicas.
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Lenda de Portugal

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Como surgem os bichos das frutas?

Eles chegam ao interior delas ainda no formato de minúsculos ovos que se tornarão filhotes de um inseto chamado mosca-da-fruta, pertencente à família Tephrytydae.

"Depois de fecundadas, essas moscas perfuram as cascas das frutas para colocar seus ovos lá dentro", afirma a bióloga Denise Selivon-Scheepmaker, da Universidade de São Paulo (USP), especialista nesses bichinhos, que têm vários gêneros e espécies espalhados pelo mundo.

No Brasil, o gênero mais comum é o Anastrepha. O interior das frutas, local bem protegido e rico em alimentos, se revela um berçário ideal para o desenvolvimento das futuras moscas. Algumas espécies são capazes de utilizar diferentes frutas como hospedagem. Assim, se em uma determinada época do ano as goiabas, por exemplo, não estão disponíveis, elas podem procurar por mangas ou pêssegos para depositar seus ovos.

Mas há também alguns tipos de moscas que só usam uma variedade de fruta. Nesse caso, os cientistas ainda lutam para descobrir como essas espécies sobrevivem durante os períodos de entressafra.

A culpa é das moscas O crescimento de suas larvas acelera o apodrecimento da fruta

1. Com uma espécie de ferrão localizado no abdômen, a mosca-da-fruta rompe a casca e deixa seus ovos dentro do fruto.

2. Esses ovos se transformam em larvas que se alimentam da polpa da fruta e vão abrindo nela túneis onde passam a viver. Isso favorece a proliferação de bactérias que aceleram o apodrecimento da fruta. Para as larvas, esse processo é importante, pois a casca fica permeável, permitindo a entrada de mais ar e facilitando sua respiração.

3. Quando a fruta cai do pé, a larvase enterra alguns centímetros no solo para continuar seu desenvolvimento no estágio de pupa, um período intermediário antes da metamorfose total. Após dez dias, ela finalmente vira uma mosca.

Fonte: ME

John Lennon - Parte 1

John Lennon (John Winston Lennon), cantor, compositor, escritor e ativista, nasceu na cidade de Liverpool, Inglaterra, em 9 de outubro de 1940, e faleceu em Nova Iorque, NY, Estados Unidos, em 8 de dezembro de 1980. Ganhou notoriedade mundial como um dos fundadores do grupo de rock britânico The Beatles.

Na época da existência dos Beatles, John Lennon formou com Paul McCartney o que seria uma das melhores e mais famosas duplas de compositores de todos os tempos, a dupla Lennon/McCartney. John Lennon foi casado com Cynthia Powell, e com ela teve o filho Julian.

Em 1966, conheceu a artista plástica japonesa Yoko Ono. Em 1968, Lennon e Yoko produziram um álbum experimental, Unfinished Music No.1: Two Virgins, que causou controvérsia por apresentar o casal nu, de frente e de costas, na capa e contracapa. A partir deste momento, John e Yoko iniciariam uma parceria artística e amorosa. Cynthia Powell pediu o divórcio no mesmo ano, alegando adultério.

Em 1969, o casal se casou numa cerimônia privada no rochedo de Gibraltar. Usaram a repercussão de seu casamento para divulgar um evento pela paz, chamado de "Bed in", ou "John e Yoko na cama pela paz", como um resultado prático de sua lua-de-mel, realizada no Hotel Hilton, em Amsterdã. No final do mesmo ano, Lennon comunicou aos seus parceiros de banda que estava deixando os Beatles. Ainda no mesmo período, Lennon devolveu sua medalha de Membro do Império Britânico à Rainha Elizabeth, como uma forma de protesto contra o apoio do Reino Unido à guerra do Vietnã, o envolvimento do Reino Unido no conflito de Biafra e "o fraco desenvolvimento de Cold Turkey nas paradas de sucesso".

Em 10 de abril de 1970, Paul McCartney anunciou oficialmente o fim dos Beatles. Antes disso, John Lennon havia lançado outros dois álbuns experimentais, Life with lions e Wedding album. Também lançara o compacto "Cold Turkey" e o disco ao vivo Live peace in Toronto, creditados à banda Plastic Ono Band, com a participação de Eric Clapton. No final do ano, sai o primeiro disco solo de Lennon, após o fim dos Beatles: John Lennon/Plastic Ono Band, que contou com a participação de Ringo Starr, Yoko Ono e Klaus Voormann.

Durante a década de 1970, John e Yoko envolveram-se em vários eventos políticos, como promoção à paz, pelos direitos das mulheres e trabalhadores e também exigindo o fim da Guerra do Vietnã. Seu envolvimento com líderes da extrema-esquerda norte-americana, com Jerry Rubin, Abbie Hoffman e John Sinclair, além de seu apoio formal ao Partido dos Panteras Negras, deu início a uma perseguição ilegal do governo Nixon ao casal. A pedido do Governo, a Imigração deu início a um processo de extradição de John Lennon dos EUA, que durou cerca de três anos, período em que John ficou separado de Yoko Ono por 18 meses, entre 1973 e 1975.

Após reconciliar-se com Yoko, vencer o processo de imigração e conseguir o Green Card, Lennon decidiu afastar-se da música para dedicar-se à criação de seu filho Sean Taro Ono Lennon, nascido no mesmo dia de seu aniversário, em 1975. O casal voltou aos estúdios em 1980 para gravar um novo álbum, Double Fantasy, lançado em novembro. Era como um recomeço. Porém em 8 de dezembro do mesmo ano, John foi assassinado em Nova York por Mark David Chapman, quando retornava do estúdio de gravação junto com a mulher.

Dentre as composições de destaque de John Lennon (creditadas a Lennon/ McCartney) estão "Help!", "Strawberry Fields Forever" e "All You Need Is Love", "Revolution", "Lucy in the Sky with Diamonds", "Come Together", "Across the Universe, "Don't Let Me Down" e na carreira solo "Imagine", "Instant Karma!", "Happy Xmas (War is Over)", "Woman", "(Just Like) Starting Over" e "Watching the Wheels".

Infância e adolescência

Único filho de Alfred "Alf" Lennon (1912-1976) e Julia Lennon (1914-1958) (cujo sobrenome de solteira era Stanley). Os seus prenomes foram uma homenagem ao avô paterno John "Jack" Lennon e ao primeiro-ministro britânico à época Winston Churchill. Seu pai, Alf Lennon, trabalhava na marinha mercante durante a Segunda Guerra Mundial e mandava frequentemente dinheiro para a mulher e o filho que viviam em Liverpool na 9 Newcastle Road.[4] O dinheiro parou de vir quando Alf desertou. A casa em que John Lennon morou durante sua infância em Liverpool com sua Tia Mimi localizada na Menlove Avenue

Após ser muito criticada pela família Stanley a respeito de continuar casada e "viver em pecado" com Bobby Dykins, e a considerável pressão de sua irmã Mary "Mimi" Smith (que por duas vezes contactou o Serviço Social de Liverpool reclamando por John ter que dormir na mesma cama que o casal Julia e Bobby) Julia deixou o filho aos cuidados de Mimi. Em 1946, Alfred visitou a casa de Tia Mimi e levou John até Blackpool e secretamente planeou emigrar para a Nova Zelândia com o garoto. Após o fracasso de sua tentativa, Alfred largou o menino com Julia e não manteve contato com John até o início da Beatlemania, quando eles se reencontraram.

Julia pegou novamente John e levou-o para sua casa matriculando-o numa escola local, mas poucas semanas depois ela devolveu-o a Tia Mimi. Julia mais tarde comprou para John sua primeira guitarra. Como John tinha dificuldades em aprender acordes, Julia ensinou-os usando um banjo e um ukelele que eram instrumentos mais simples.

John estudou na Dovedale County Primary School até passar no exame Eleven-Plus (ou 11 +). Certa vez, ele citou um acontecimento que ocorreu na escola: "Quando eu tinha 5 anos, minha mãe sempre me disse que a felicidade era a chave para a vida. Quando eu fui para a escola, me perguntaram o que eu queria ser quando crescesse. Eu escrevi “feliz”. Eles me disseram que eu não entendi a pergunta, e eu lhes disse que eles não entendiam a vida." De 1952 a 1957, ele estudou na Quarry Bank Grammar School em Liverpool, onde ficou conhecido pelos seus desenhos e pelas suas mímicas. Nessa escola, em 1956, ele fundou uma banda de skiffle chamada The Quarrymen, que daria origem aos Beatles.

Em 15 de julho de 1958, após uma visita, Julia morreu atropelada por um policial, Eric Clague, que dirigia bêbado. Devido a esse fato, Paul e John acabaram se tornando mais próximos, pois Paul também perdeu a mãe muito jovem, tendo ele 14 anos quando ela morreu, de câncer.

John era um aluno problemático na escola, e mesmo assim foi aceito na Liverpool College of Art. Foi nesta escola que ele conheceu sua futura esposa Cynthia Powell e fez amizade com Stuart Sutcliffe. Devido à grande amizade formada, em 1960, Stuart entrou para sua banda de rock como contrabaixista e tempos depois abandonou a banda para se casar com uma alemã em Hamburgo. Stuart morreu em 1962, aos 21 anos de hemorragia cerebral.

The Quarrymen

Lennon fundou os Quarrymen em 1956, inicialmente uma banda de skiffle (ritmo que fazia sucesso na Inglaterra na época) com seu melhor amigo na época, Pete Shotton. Lennon cantava e tocava guitarra enquanto Shotton tocava uma tábua de lavar roupas (o skiffle usava esse instrumento para dar um som rítmico às canções). Na verdade, quando a banda foi formada ela se chamou "The Black Jacks", nome que durou apenas uma semana e foi substituído por The Quarrymen em homenagem a escola que os garotos estudavam. Para incorporar o grupo foram chamados Eric Griffths (violão), Bill Smith (baixo improvisado) e Rod Davis (banjo).

No dia 6 de junho de 1956, Ivan Vaughan apresentou Paul McCartney a John Lennon, após Paul ver The Quarrymen tocar em uma festa na Igreja de St. Peter. Paul demonstrou suas habilidades como músico a John e foi convidado a entrar para a banda. Em 1957, Paul McCartney mostrou a John sua primeira composição, "I've Lost My Little Girl" (ouvindo isto, John animou-se a compor também). Vale lembrar que John teve uma certa relutância em chamar Paul para a banda, uma vez que Paul demonstrasse "talento demais", segundo até alguns próprios integrantes de época, e sendo melhor que Lennon, causava um certo medo no jovem de ser jogado de lado. Mas, o jovem Lennon logo venceu essa relutância.

Em 1958, John começou a perder o interesse pelo skiffle, começando a tocar mais rock and roll. Rod Davis que tocava banjo saiu do grupo e, em fevereiro, George Harrison entrou para o grupo. Posteriormente, Stuart Sutcliffe (chamado também de Stu) também entrou para a banda como baixista. No verão do mesmo ano, eles gravaram em um disco de acetato de 78-rpm as canções "That'll Be the Day"(composição de Buddy Holly) e "In Spite of All the Danger" (composição de McCartney e Harrison).

Em 1960, a banda trocou de nome 5 vezes. Stu sugeriu o nome The Beetles (os besouros) em homenagem a banda The Crickets (os grilos), de Buddy Holly. Após uma turnê com Johnny Gentle na Escócia, eles mudaram definitivamente o nome para The Beatles.

The Beatles

John era um destaque na banda. Allan Williams agenciou alguns shows em clubes noturnos de Hamburgo para os Beatles em 1960. Na época os Beatles passaram a ser formados por John Lennon (guitarra), Paul McCartney (guitarra), George Harrison (guitarra), Stuart Sutcliffe (baixo) e Pete Best (bateria). A primeira viagem a Hamburgo foi uma tragédia. Eles dormiam dentro de um cinema abandonado, em condições precárias, e deviam seguir um contrato para tocar lá. Eles tocavam na casa noturna determinada, mas resolveram quebrar o contrato, tocando em outro lugar também. Assim, o homem que os contratou ficou furioso e denunciou George, que era menor de idade, e George foi deportado, gastando todo o dinheiro que ganhara. Além disso, a banda foi acusada de ter causado intencionalmente um incêndio no cinema. A desculpa deles foi de que, como não tinha luz, eles tentaram fazer uma fogueira e perderam o controle. Eles voltaram arrasados para Liverpool e este foi quase o fim da banda.

No dia 21 de março de 1961, os Beatles fizeram a primeira de uma série de apresentações no Cavern Club de Liverpool. Eles voltaram a Hamburgo em abril do mesmo ano. Gravaram um disco acompanhando Tony Sheridan na canção "My Bonnie". Stuart acabou abandonando a banda para se casar com a alemã Astrid Kirchherr e não voltou mais a Liverpool. Isso talvez tenha sido uma coisa boa, pois Stuart tocava mal a ponto de ser pressionado por Paul McCartney, chegando a ponto de bater no guitarrista no palco, e ele só entrara na banda devido a sua amizade e companheiros com John, que insistira demais, a ponto de ter feito o amigo gastar o dinheiro que ganhara como artista plástico, seu sonho de profissão, para comprar o contrabaixo. Assim, Paul McCartney virou o baixista da banda.

No dia 9 de novembro de 1961, Brian Epstein viu os Beatles pela primeira vez tocando no Cavern Club e mais tarde assinou um contrato para empresariá-los. No dia 31 de dezembro, eles foram a Londres tentar arrumar um contrato de gravação com a Decca Records, mas foram dispensados. Em abril de 1962, os Beatles voltaram a Hamburgo para tocar no Star Club e receberam a notícia da morte de Stu. Isso foi um choque para John que já havia perdido seu tio George, sua mãe Julia e agora seu amigo Stu.

Finalmente, assinaram um contrato de gravação em 9 de maio de 1962 com a Parlophone Records. George Martin, o produtor musical dos Beatles, sugeriu que eles trocassem de baterista, o que foi feito com a entrada de Ringo Starr também de Liverpool. Finalizava-se então a formação dos Beatles com John Lennon (guitarra), Paul McCartney (baixo), George Harrison (guitarra) e Ringo Starr (bateria).

Em 5 de outubro de 1962, os Beatles lançaram seu primeiro compacto com a canção "Love me Do". E no dia 11 de fevereiro de 1963, em apenas um dia, gravaram seu primeiro álbum Please Please Me. Não demorou muito para os Beatles se tornarem um grande sucesso na Inglaterra. E, com o posterior sucesso nos Estados Unidos, iniciava-se a beatlemania.

Na primeira fase do grupo, John era responsável pela maioria das composições dos Beatles, mesmo elas sendo assinadas como dupla Lennon/McCartney. Era evidente sua liderança e maior produtividade musical na banda. John Lennon também começou a desenvolver-se como letrista e compôs algumas canções mais intimistas influenciadas por Bob Dylan como "I'm a loser" e "You've got to hide your love away". Durante a segunda fase dos Beatles, John revelou-se cada vez mais um grande letrista. Entre suas composições estão "All you need is love", "Strawberry Fields Forever", "A day in the life" e "Across the Universe" entre outras.

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Fonte: Wikipédia.