sábado, 5 de maio de 2012

Nós em garrafa

Vínhamos ladeira abaixo, comendo umas goiabinhas, quando surgiu na nossa frente um cavalheiro bem-posto, a sorrir, de braços abertos. Como somos bom fisionomista e reparamos logo que o distinto não era pessoa da nossa intimidade, julgamos tratar-se de um batedor de carteira.

Felizmente não era. Era um industrial. Deu o cartãozinho e passou a explicar por que cercara este valoroso escriba. Primeiro explicou que a indústria dele era embriagante e, antes que tivéssemos qualquer atitude de espanto, esclareceu que fabricava bebidas alcoólicas.

De surpresa em surpresa disse que precisava de nós: — Para beber? — perguntamos, já armando uma desculpa em defesa do fígado. Felizmente não era.

O bem-posto cavalheiro, falante como um animador de auditório, afirmou que se quiséssemos beber só era um prazer oferecer a bebida, mas que vinha com outra intenção. Sua firma vai lançar lia praça um conhaque nacional (e ante a nossa cara de enjôo botou vírgula na frase e jurou que não é cachaça vagabunda fingindo de conhaque não. É conhaque no duro).

Mas... a firma vai lançar um conhaque e o departamento de promoções... vejam vocês, até pra vender essas coisas eles têm departamento de promoções ... o tal departamento lembrou que seria ótimo colocar o nome de Stanislaw Ponte Preta na beberagem.

Ora que coisa! Tanto rodeio para no fim vir propor que fôssemos padrinho de conhaque nacional. Claro que não. — Mas nós pagamos — insistiu o industrial. — Pagamos não. Pagariam. E não fariam mais do que a obrigação — dissemos nós, já a nos imaginar nas prateleiras dos botecos desta Buracap, devidamente engarrafado.

Agora vejam se fica bonito. Uma personalidade marcante como a nossa virar motivo de discussão em casa. A mulher dizendo para o marido, que chegou meio sobre o alcantilado para o jantar: "Chegou atrasado, não é, cachorrão? E ainda chega com bafo de Stanislaw Ponte Preta."

Se isto é proposta que se faça ao guia espiritual de milhares de leitores universais!

Como é que íamos ser respeitados depois de concordar com a proposta?

Estamos aqui a imaginar um pai a dizer para a filha: "Você é a vergonha da família, está viciada em Stanislaw Ponte Preta."

Não, de jeito nenhum. Que horror teríamos ao saber que um pilantra qualquer poderia chegar no balcão de um frege e berrar para o taberneiro, em noite de frio: "Me dá um Stanislaw aí pra me esquentar."

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Fonte: Tia Zulmira e Eu  - Stanislaw Ponte Preta - 6.ª edição - Ilustrado por Jaguar - EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA S.A.

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