domingo, 20 de janeiro de 2013

Dia do Papai

A jovem senhora, realmente muito bonita, estava na boca de uns e outros. A Candinha já morara em seu assunto. Madame, de fato, tinha sido educada no ambiente sadio do Vogue, fora mais ou menos modelo de casa de modas e tinha até feito sua experiência no chamado teatro rebolado. Depois conheceu o otário, aliás, o marido, e casara. Tivera um filhinho mais ou menos louro, embora o acima citado fosse mais ou menos moreno.

Na época, Primo Altamirando — muito do mau caráter — chegou a comentar:

— Tava lá Mane Sinhô. (1)

O menino cresceu até ficar de bom tamanho, a distinta até que andava mais pra calma do que pra assanhada, e o murmúrio foi diminuindo até parar. O marido não tomava conhecimento, mesmo porque, conforme diz o ditado: "os maridos e os Diários Associados são os últimos a saber".

Veio, então, o "Dia do Papai". Chamaram o garoto, deram um embrulho a ele (quem'deu foi a vovó, coitada, sempre tão amiga de datas), e explicaram :

— Isto é um presente, porque hoje é o "Dia do Papai". Você pega esse presente e guarda. Logo mais você entrega ao seu pai.

O garoto, que adorava ouvir conversa, fez que sim com a cabeça e disse que tava legal, que depois entregava o presente ao Papai. A avó ainda deu um beijinho nele antes de sair, crente que tudo ia acontecer como ela previa. Depois veio o fim da tarde, a mãe do garoto — a que tinha sido até candidata a Rainha de um baile aí — chegou do dentista, o marido dela chegou logo em seguida e aí caiu a noite.

O menininho então lembrou-se da recomendação da avó. Tinha que pegar o embrulho do presente e entregar ao Papai. Foi lá dentro, apanhou o embrulho no armário, botou debaixo do braço e saiu pra rua. Entrou na casa ao lado, tocou a campainha e, quando o vizinho apareceu, entregou-lhe o embrulho.
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(1) Tava lá Mane Sinhô. — Trecho da canção "Uma Casa de Caboclo", que vem logo depois daquele pedaço em que o cantor diz que numa casa de caboclo um é pouco, dois é bom, três é demais. O terceiro, no verso, era Mane Sinhô.

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Fonte: Tia Zulmira e Eu  - Stanislaw Ponte Preta - 6.ª edição - Ilustrado por Jaguar - EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA S.A.

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